Considerações críticas sobre o processo de pensamento da Teoria das Restrições - Uma abordagem teórica e prática

Considerações críticas sobre o processo de pensamento da Teoria das Restrições - Uma abordagem teórica e prática

Blog da Produttare

Autores:

José Antonio Valle Antunes Júnior
Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS e PRODUTTARE Consultores Associados
Rua 24 de Outubro 111/1103, Moinhos de Vento 90510-002 – Porto Alegre - RS

Marcelo Klippel
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS e KLIPPEL Consultores Associados
Rua 24 de Outubro 111/1103, Moinhos de Vento 90510-002 – Porto Alegre - RS

Abstract


This paper presents some critical considerations about the Thinking Process of the Theory of Constraints – TP of TOC – developed by Eliyahu Goldratt. The article makes evident that the central consideration of the TOC consists in concentrating all efforts in the so called core problems. Also, the paper describes the techniques involved in the TP of TOC, showing that these techniques and methods could be used as stand alone basis with sufficient results. Finally, the article makes evident the qualitative feature of the TP of TOC that uses the Scientific Method for seeking the systematics of Structuring, Identification, Analysis and Solution of Problems.

Key Words: TP, TOC, Core

1.) Introdução


A Teoria das Restrições constitui-se em um tema relevante dentro do contexto das discussões travadas no âmbito da Engenharia de Produção nas décadas de 80 e 90.

Embora inicialmente, Goldratt tenha proposto um conjunto de princípios e técnicas ligadas a Administração da Produção – conhecido como OPT – é somente no início da década de 90 que ele passa a explicitar a lógica interna da Teoria das Restrições. Para compreender com mais detalhes os conceitos da TOC, Goldratt propugna a necessidade da compreensão do chamado Processo de Pensamento da Teoria das Restrições.

2.) Apresentação dos Conceitos Básicos do Processo de Pensamento da Teoria das Restrições


O Processo de Pensamento da Teoria das Restrições – PP da TOC - pode ser considerado o Método de Identificação, Análise e Solução de Problemas adotado na lógica mais ampla da TOC. Historicamente, o PP da TOC foi proposto pela primeira vez no livro “What is This Thing Called Theory of Constraints and How Should it be Implemented” (Goldratt, 1990). Posteriormente, Goldratt (1994) apresenta o PP da TOC em seu livro “Mais que SORTE ... um Processo de Raciocínio”, que é uma continuidade do livro ‘A Meta’.


O Método de Identificação, Análise e Solução de Problemas desenvolvido por Goldratt objetiva responder a três questões essenciais, que são as seguintes:


a) O que mudar;
b) Mudar para o que;
c) Como provocar a mudança.


Conforme Alvarez (1996), a proposição central de Goldratt ao propor o PP da TOC, consiste em concentrar todos os esforços nos chamados problemas centrais (core problems), ou seja, naqueles problemas que impactam de maneira significativa o desempenho global do sistema. Segundo Dettmer (1995) muitos dos efeitos indesejáveis de um dado sistema são causados por um número muito reduzido de problemas centrais. Portanto, a solução simultânea dos problemas centrais permite garantir a eliminação dos efeitos indesejáveis.


A primeira pergunta (primeira etapa), ‘o que mudar’, é respondida via a construção da chamada Árvore da Realidade Atual e objetiva essencialmente determinar o(s) problema(s) central(is) encontrado(s) em um determinado sistema. Para que isto possa ser feito utiliza-se do Método Científico, que está baseado na lógica de efeito-causa-efeito e em uma visão crítica objetiva da realidade em análise. Conforme Kingman (1996) este passo deve ser construído a partir de equipes, geralmente de caráter interfuncional, que objetivam analisar detalhadamente os problemas raízes (centrais). Como pontos positivos que podem ser observados a partir da construção da árvore, Kingman (1996) observa: i) A possibilidade de proporcionar uma efetiva comunicação dos principais problemas na organização; ii) O entendimento comum dos sistemas envolvidos.


A segunda etapa, mudar ´para o que´, parte dos problemas centrais determinados pela Árvore da Realidade Atual buscando a formulação de uma solução eficaz para a eliminação dos atuais problemas que limitam o desempenho global do sistema em análise. Nesta fase as Técnicas utilizadas são:


a) ‘Evaporação das Nuvens’;


b) Árvore da Realidade Futura.


A Técnica mais criativa e também a que exige maior criatividade por parte dos integrantes do grupo que utilizam o PP da TOC é intitulada de ‘Evaporação das Nuvens’. A técnica da ‘Evaporação das Nuvens’ parte de um determinado problema estruturado motivando/incentivando a verbalização dos pressupostos implícitos das posições conflituosas real ou aparentemente existentes. A técnica objetiva, via a busca sistemática de soluções criativas de mais alto nível (síntese), encontrar soluções que rompam objetivamente estes pressupostos implícitos, que levariam à adoção de soluções práticas de compromisso entre as posições antagônicas em jogo.


O pressuposto da Técnica da ‘Evaporação das Nuvens’ é a de que o processo de solução de problemas, ao contrário de exigir soluções de compromisso entre duas ou mais propostas em conflito, pode também ser resolvido com uma solução simples de maior nível que elimine os compromissos existentes entre as duas ou mais propostas conflituosas anteriores. Ou seja, Goldratt aqui utiliza-se da chamada Lógica Dialética de abordagem dos problemas. A idéia não consiste em achar soluções de compromisso entre a tese e a antítese de um determinado problema. A Técnica da ‘Evaporação das Nuvens’ parte da crença de que, em todos os casos, existe a possibilidade de gerar uma síntese de maior nível do que a tese e a antítese que estão em jogo. Segundo Alvarez “a utilização da Técnica da Evaporação das Nuvens é um exercício de criatividade, no qual se busca introduzir elementos novos, capazes de invalidar os pressupostos existentes” (Alvarez, 1996, p. 77). Em outras palavras, existem determinados pressupostos que sustentam e/ou fundamentam tanto a tese como a antítese em jogo em um dado problema, cabendo à Técnica da ‘Evaporação das Nuvens’ encontrar solução(ões) criativa(s) que permita(m) atender tanto aos pressupostos da tese como da antítese. As idéias que permitem alcançar esta síntese de maior nível são intituladas por Goldratt de Injeções.


Shingo (1996a) pode ser utilizado para dar um exemplo, associado à Troca Rápida de Ferramentas, da utilização do método dialético e sua relação com a Técnica da ‘Evaporação das Nuvens’. É proposta uma tese segundo a qual os custos globais podem ser reduzidos através do aumento do tamanho dos lotes nas operações que exigem longos tempos de preparação. Em oposição a esta idéia existe um argumento – antítese – segundo o qual tamanhos maiores de lotes resultam em um conjunto de Perdas derivadas do aumento destes estoques. Aparentemente, estas duas proposições não são passíveis de conciliação sendo necessário adotar uma solução de compromisso, intermediária entre os dois argumentos, que é a lógica do lote econômico de fabricação. A injeção para este problema, que faz uma síntese de maior nível da tese e antítese em jogo, é a de que é possível trocar as ferramentas (tempos de preparação) em um tempo muito baixo, menor do que 10 minutos. Neste caso é possível produzir lotes pequenos rompendo os pressupostos que estavam por detrás do ‘aparente conflito’ e que levam à adoção de uma solução de compromisso.


A partir das injeções propostas, que devem ser eficazes para garantir a efetividade nas soluções adotadas, é construída a chamada Árvore da Realidade Futura. A Árvore da Realidade Futura parte, também, de uma lógica do tipo efeito-causa-efeito buscando deixar claro onde se deseja chegar com as injeções propostas pela Técnica da ‘Evaporação das Nuvens’. Ou seja, a Árvore da Realidade Futura é construída a partir das Injeções propostas na fase anterior do método. A Árvore da Realidade Futura, em síntese, objetiva proporcionar uma visualização de como será o futuro do sistema analisado, caso sejam colocadas em prática as injeções propostas.


A terceira etapa do método objetiva responder a questão do ´como´ provocar a mudança. Nesta etapa são utilizadas duas Técnicas básicas:


a) Árvore dos Pré-Requisitos;


b) Árvore de Transição.


Nesta etapa a idéia consiste em propor um plano capaz de alterar a realidade, o que só é possível de concretizar se forem realizadas ações objetivas no sentido da mudança. A primeira Técnica utilizada - Árvore dos Pré-Requisitos - parte do pressuposto de que, como as organizações são constituídas de pessoas, sempre aparecerão resistências e obstáculos às mudanças propostas. O objetivo de Goldratt consiste em evidenciar as eventuais resistências às mudanças propostas, no intuito de planejar ações que possam romper os pressupostos que sustentam os obstáculos existentes. A operacionalização da Árvore dos Pré-Requisitos é feita via o estabelecimento de objetivos intermediários capazes de impedir a ação dos eventuais obstáculos às mudanças. Estes objetivos intermediários devem ser checados até que todos os obstáculos sejam eliminados. Posteriormente utiliza-se a Técnica da Árvore de Transição que, essencialmente, “associa a cada objetivo intermediário, uma ação a ser executada” (Alvarez, 1996, p.86). Em outras palavras, a Árvore de Transição é responsável pela montagem dos planos de ação objetivos que devem, ao menos teoricamente, levar à eliminação das causas raízes dos problemas.

3.) Análise Crítica do Processo de Pensamento da TOC


Uma análise crítica da proposição e da utilização do Processo de Pensamento da TOC em Organizações de forma geral permite evidenciar os seguintes tópicos:


• O Processo de Pensamento da TOC apresenta um caráter qualitativo baseado em fatos da realidade, utilizando o Método Científico para busca sistemática da Estruturação, Identificação, Análise e Solução dos problemas. É possível que, em um certo número de casos, seja necessário aliar, às conjecturas das relações de efeito-causa-efeito proposto pelo grupo envolvido, fatos quantitativos derivados dos fenômenos empíricos observados na prática das Empresas.


• Conforme Noreen et alli, “as árvores de consenso pareceram funcionar em algumas Empresas e não em outras” (Noreen et alli, 1996, p. 56). Os autores deste trabalho sugerem que isto possa ocorrer em virtude dos Paradigmas, Conceitos e Técnicas que se constituem nos pressupostos básicos para a construção e estruturação dos problemas. Caso as pessoas do grupo trabalhem tendo como pressupostos diferentes Paradigmas em termos de Administração e Engenharia de Produção (por exemplo os Paradigmas Just-In-Time e Just-In-Case), simplesmente o que não se constitui um problema para um dado profissional, por exemplo a existência de grandes lotes de produção (visão Just-In-Case), pode se constituir em um problema para outro profissional, que parta de um pressuposto distinto, segundo o qual a existência de grandes lotes se constitui em um grave empecilho para a melhoria da Qualidade e da Produtividade na Empresa (visão Just-In-Time). Ou seja, as árvores são construídas a partir dos paradigmas professados pelos participantes do grupo. Sendo assim, profissionais que professem diferentes paradigmas terão a tendência de estruturar o mesmo problema de forma diferenciada. A partir deste paradigma são constituídas Teorias e, como diz Deming, é impossível construir o conhecimento sem a existência prévia de uma Teoria. Esta discussão sugere a necessidade de desenvolver uma ampla discussão teórica sobre os princípios e técnicos gerias da Engenharia e da Administração da Produção, que deve preceder a construção das árvores propostas pelo Processo de Pensamento da TOC.


• Um aspecto importante no desenvolvimento do Método consiste em utilizar a máxima precisão conceitual possível. Isto assegurará um efetivo compartilhamento do conteúdo das relações de efeito-causa-efeito pelos membros do grupo. Caso os conceitos não estejam claramente explicitados o conteúdo das frases utilizadas tendem a dificultar o desenvolvimento do trabalho no âmbito da Organização onde o trabalho é realizado.


• As árvores constituem-se em um mecanismo eficaz para a construção do consenso sobre os problemas existentes, suas causas raízes e as proposições para a solução dos mesmos, o que é catalisado pela existência de um paradigma comum entre os participantes. Também, servem como dispositivos eficazes no sentido de comunicar, para as demais pessoas, os conhecimentos gerados durante o processo de elaboração do trabalho. No último sentido podem servir como efetivo canal de comunicação dos problemas observados nas Organizações.


• As Técnicas das diversas fases do PP da TOC podem ser utilizadas individualmente com resultados satisfatórios (Noreen et alli, 1996). Como técnicas individuais, a Árvore da Realidade Atual e a Evaporação das Nuvens são as mais utilizadas na realidade prática. A Árvore da Realidade Atual pode servir para estabelecer, de forma sistêmica e rápida, os principais problemas de uma dada atividade genérica. A Evaporação das Nuvens é uma Técnica que, utilizando a criatividade e o pensamento dialético, permite obter boas soluções a partir de situações conflituosas que aparentemente exigiriam soluções intermediárias de compromisso.


• A problemática da auditoria das diferentes árvores é, também, um tema relevante. Uma vez construída a árvore pelos atores envolvidos - Grupo de Trabalho - é muito importante o processo de validação que se segue. Isto é relevante na medida em que pode haver um vício de origem na constituição do grupo de trabalho não levando em conta todas as visões possíveis do problema. Sendo assim, é essencial que após o uso das diferentes Técnicas do método seja levado adiante uma auditoria independente por pessoas que conheçam os problemas levantados e que não tenham participado diretamente do processo de trabalho.

4.) Conclusões


As considerações abordadas no presente trabalho permitem concluir que o PP da TOC deve ser utilizado enquanto uma ferramenta lógica de Identificação, Análise e Solução de Problemas. A análise crítica e criteriosa da utilização do PP da TOC mostra a sua real dependência do paradigma, e das respectivas teorias adotadas. Sendo assim, as percepções que são utilizadas no processo de Identificação, Análise e Solução de Problemas em geral dependem das crenças e valores professados pelos atores envolvidos com as questões práticas em debate. Ou seja, os atores envolvidos no debate influenciam ampla e diretamente no processo descrito acima.


Ainda, observa-se que a utilização das ferramentas e técnicas do PP da TOC de maneira individual também permite atingir resultados satisfatórios. Finalmente, cabe ressaltar que a utilização do PP da TOC para a análise dos Sistemas Produtivos tem a potencialidade de suportar objetivamente a implantação de soluções de melhorias voltadas diretamente aos processos.


5.) Referências Bibliográficas


ALVAREZ, R. R. Desenvolvimento de uma análise comparativa de métodos de identificação, análise e solução de problemas. Porto Alegre, 1996. Dissertação de Mestrado em Engenharia de Produção, Universidade Federal do Rio Grande do Sul


DETTMER, H. W. Eliyahu M. Goldratt – The Theory of Constraints: A Systems Approach to Continuous Improvement. Institute of Safety and System Mangement, 1995.


GOLDRATT, Eliyahu M., COX, Jeff. A Meta. 12.ed. São Paulo: Educator, 1997.


GOLDRATT, E. M. What Is This Thing Called Theory of Constraints and How It Should Be Implemented? New York, North River Press, 1990.


GOLDRATT, E. M. Mais que Sorte ... Um Processo de Raciocínio. Editora Educator, São Paulo, 1994.


KINGMAN, O. The Thinking Processes and Effective Problem Solving. In: Make Common Sense a Common Practice. Proceedings do 1996 APICS Constraint Management Symposium and Technical Exhibit, april 17-19, p.110-116, Detroit, MI, 1996.


NOREEN, Eric, SMITH, Debra e MACKEY, James T. A Teoria das Restrições e suas implicações na contabilidade gerencial. São Paulo: Educator, 1996.


SHINGO, Shigeo. O Sistema Toyota de Produção – Do ponto de vista da engenharia de produção. Porto Alegre: Bookmann, 1996a.

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